terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Subindo pelas paredes

Se você, como a maioria da população, já tomou chuva, então deve saber que um dos efeitos desse acontecimento é a inexorável roupa molhada. Isso significa basicamente que sua roupa, além de uns trinta quilos mais pesada, fica grudada no seu corpo. Já imaginou por quê isso acontece?

Em primeiro lugar, a roupa fica mais pesada pois está ensopada de água. Até agora é mais ou menos óbvio. Mas a pergunta é interessante quando consideramos o segundo fato: Por quê a roupa molhada gruda no corpo?
O princípio por trás desse fenômeno é o mesmo que faz com que a água suba pelas paredes de um tubo muito fino: é a capilaridade.
Quando a água, que é líquida, toca uma superfície, duas forças intermoleculares se tornam importantes: a força de coesão e a força de adesão. A força de coesão é a força responsável por manter as moléculas da água unidas. Basicamente, é a força que mantém a água toda junta, responsável também pela tensão superficial: aquela voltinha que você vê quando enche uma garrafa de água até um pouco acima do seu volume.
A força de adesão é a responsável por "colar" a água nas coisas que não são água. Ela é responsável por você se molhar, e age de maneira a juntar a sua roupa molhada ao seu corpo. Também é responsável por muita gente usar cuspe pra selar cartas e ficar particularmente decepcionado quando o selo seca.
Se a água encontra-se em um tubo suficientemente fino, estas duas forças contribuem para que ela suba pelas paredes do mesmo. A força de adesão força o líquido na direção da parede do tubo, e a força de coesão puxa o "resto da água" junto, como se fosse um alpinista puxando o outro, subindo tubo afora. Essa contribuição chega a vencer a força da gravidade, e quanto mais fino o tubo, maior a altura que a água alcança.

Vale notar que a força de adesão deve ser suficiente para realizar tal trabalho. O mercúrio, por exemplo, não possui adesão com um tubo de vidro, e tende a descer o tubo ao invés de subir (o.o).
Então, da próxima vez que você vir uma árvore (o que deve ser nos próximos segundos, salvo circunstâncias excepcionais), saiba que a seiva só chega até as folhas por esse princípio, que não tem nada a ver com cabelos, e que promove concursos de camiseta molhada nos quatro cantos do mundo. Viva a capilaridade!
Até mais.

Nota #1: A intenção era colocar uma foto de roupa molhada, mas nenhuma que eu encontrei se encaixa muito bem no perfil do blog. Quem sabe na próxima.

Nota #2: Se você quiser comprar a cortina da foto, segue o link:
http://www.thinkgeek.com/homeoffice/gear/8a2f/

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Sobre coisas que dão errado

Ao lado da Lei da Gravitação Universal, a Lei de Murphy é talvez umas das leis mais conhecidas entre leigos no mundo todo. Embora a primeira seja de demonstração muito mais científica, a segunda é muito mais enunciada e posta em prática no dia-a-dia. Sejamos honestos, ninguém se lembra do pobre Newton quando vê água caindo na torneira.
Hoje vou contar a história por trás da Lei de Murphy.
Entre 1948 e 1949, um sujeito muito bacana, chamado Dr. John Stapp trabalhava na Base Edwards da Força Aérea dos Estados Unidos. Seu projeto envolvia testar a resistência do corpo humano a uma rápida aceleração, tal qual um piloto é submetido, por exemplo, na decolagem de um caça a partir de um porta-aviões. Os testes eram feitos utilizando um grande trilho, com uma espécie de cockpit preso a ele. Por razões de segurança, era usado no experimento um boneco, parecido com aqueles usados nos testes de airbags, mas após certo tempo foi o próprio Stapp quem ficou de cobaia. 
Durante estes testes, foi levantada uma questão quanto à precisão dos instrumentos que faziam a leitura dos efeitos da aceleração, e então um cara ainda mais bacana, chamado Edward Murphy, propôs que se utilizasse um medidor de tensão eletrônico, acoplado nas correias que prendiam o corpo do Dr. Stapp, para medir a força submetida a elas na desaceleração. O assistente de Murphy fez as conexões dos fios, e um teste foi feito usando um macaco.
Tudo ocorreu como planejado, exceto que os sensores não detectaram nenhuma aceleração (!). Ficou claro, nesse instante, que o assistente havia conectado os fios ao contrário. Murphy, irritado, fez a fatídica e histórica declaração: "If that guy has any way of making a mistake, he will.", ou traduzindo: "Se aquele cara tiver alguma forma de cometer um erro, ele cometerá.".
Após esse episódio, a frase ficou conhecida entre os membros da equipe do projeto, e no boca-a-boca foi reduzida para "Se pode dar errado, vai dar errado.", e nascia assim a Lei de Murphy, embora ainda não possuía esse nome.
O nome foi dado pelo próprio Stapp, em uma conferência, quando perguntado sobre o porquê de ninguém ter se ferido gravemente durante os testes. Sua resposta foi essa: "Porque sempre levamos a Lei de Murphy em consideração."
Então, a próxima vez em que você for pego por uma chuva torrencial a 200 metros de casa, sem um guarda-chuva, ou bater o dedo mindinho na beirada da cama em um dia frio, saiba que o que pode dar errado, dá errado. É a Lei de Murphy, é assim que funciona.

Link:
Se você se interessou pela verdadeira história da Lei de Murphy, segue o link para os quatro artigos originais escritos por Nick T. Spark nos Annals of Improbable Research, Why Everything You Know About Murphy's Law is Wrong:

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

O Caso "Quem Somos Nós?"

Pra quem não sabe, "Quem Somos Nós?", título traduzido para o português do fatídico "What the bleep do we know?", é um filme que aborda temas de espiritualidade e divagações da consciência, e tristemente relacionando-os (ou tentando) à Mecânica Quântica.

Não sei até que ponto as pessoas que vêm até mim foram influenciadas por esse filme, dizendo que ele despertou nelas a curiosidade à respeito da Física Quântica, mas garanto-lhes: Quando você tem curiosidade à respeito de leões depois de assistir O Rei Leão (que aliás é muito bom), você deve ter noção de que aquilo que quer saber é muito diferente do filme que você assistiu. Isso acontece com "Quem Somos Nós?".
A Mecânica Quântica envolve não só conceitos complexos de probabilidade e de medição de grandezas físicas, como também exige conceitos matemáticos tão profundos que é impossível falar sobre ela omitindo este último, o que a torna vaga, sem sentido, e principalmente aberta à milhões de interpretações equivocadas. Por esse motivo, à menos que você tenha feito pelo menos uma disciplina introdutória à Física Quântica, seja em um curso de Graduação em Física ou Química, ou um safári na África, saiba que a visão demonstrada pelo filme "Quem Somos Nós?" é deturpada e errada, tentando unir Ciência e espiritualidade simplesmente jogando fora a primeira. Mas não sou só eu quem está dizendo:
"Este filme é ainda mais pretensioso do que enfadonho. E ele é estonteantemente enfadonho - a menos que, é claro, você tenha sido enganado por essa farsa New Age, e nesse caso pode até ser - como muitos inocentes crédulos disseram - "life-changing". Richard Dawkins, professor de Zoologia, Etologia e Evolucionismo em Oxford.
"Ouça meu conselho e não assista a esse filme. Eu repito, não assista a esse filme. Repito novamente, não assista a esse filme. Se você assistir, deixará o cinema desinformado, 8 libras mais pobre e tendo perdido duas horas da sua vida." Simon Singh, PhD em Fìsica de Partículas em Cambridge, em sua Revisão do filme para a Rádio 4 BBC.
O recado tá dado. Até mais, e obrigado pelos peixes.

Mapa do Labirinto